Interessante ser esta a primeira resenha que escrevo sobre o Cradle Of Filth, já que acompanho a banda desde seus primeiros álbuns quando ainda eram classificados de maneira simplória e errônea como apenas mais uma banda de Black Metal. Dessa forma, não é preciso ser um gênio para saber que recebiam uma tonelada de críticas descabidas dos fãs mais puristas. O grupo demorou para ser compreendido e os consumidores do Metal extremo insistiram por anos à fio em colocar os ótimos discos de Dani Filth e seus comparsas, no mesmo balaio de bandas que não tinham absolutamente nada em comum com o que era praticado pelo Cradle.
Depois de muito tempo, quando a banda já era uma das maiores neste segmento, foi que surgiu a classificação Extreme Gothic/ Symphonic Black Metal. Sem dúvida, a mais adequada para representar a musicalidade complexa e única do Cradle Of Filth. É verdade que em determinado momento da discografia, talvez em discos como “Nymphetamine” (2004) e “Thornography” (2006), o lado mais Gothic Metal estava aflorado em demasia e, se formos muito exigentes, podemos dizer que deram uma leve derrapada.
O mais justo seria dizer que estamos diante de uma banda que, desde seu primeiro álbum de estúdio, jamais se afastou muito das suas principais características. E além disso, ainda é uma das poucas que carrega consigo um DNA musical inegavelmente único, seja pela maneira inimitável de Dani cantar ou pelas estruturas líricas e a construção dos fraseados vocais serem absolutamente diferentes de tudo o que está por aí. Soma-se a isso os trechos orquestrados, os vocais femininos, os solos de guitarra melódicos e toda a parte visual… Definitivamente, não existe nenhuma banda como o Cradle Of Filth
Uma obra caótica que mergulha dentro do próprio catálogo da banda
“The Screaming Of The Valkyries” é o primeiro trabalho de estúdio lançado pela Napalm Records e o décimo quarto da carreira. O disco chegou às lojas e plataformas de streaming no último dia 21 de março e veio com a difícil missão de superar os últimos dois registros, “Cryptoriana (The Seductiveness Of Decay)” (2017) e “Existence Is Futile” (2021). Este último, eleito primeiro lugar em nossa lista de melhores do ano na categoria Black Metal naquele ano
Sobre “The Screaming Of The Valkyries”, é justo afirmar que ele traz elementos de basicamente toda a trajetória da banda. Desde faixas mais viscerais e velozes como “To Live Deliciously” e “When Misery Was A Stranger”, com referências aos primórdios, passando por “Demagoguery” e “White Hellebore”, onde encontramos elementos de álbuns como “Dusk And Her Embrace” (1996) e “Midian” (2000), culminando em composições mais melódicas como “Malignant Perfection” e “Non Omnis Moriar”, onde se mesclam melodias apresentadas em trabalhos como o seminal “Cruelty And The Beast” e discos onde o lado Gothic Metal é mais explorado.
Nota do redator: esses videoclipes são simplesmente sensacionais e altamente indicados a amantes do terror.
A eterna capacidade de se reinventar
“The Trinity Of Shadows” é uma faixa que exemplifica muito bem o trabalho do novo guitarrista Donny Burbage. O músico acrescentou muito na musicalidade da banda, trazendo riffs simplesmente fantásticos e somando uma técnica muito diferente daquela apresentada por Ashok. Com isso, o Cradle Of Filth ganhou uma dupla com características muito distintas, mas que ao somar forças, adiciona novos temperos a uma identidade que, por si só, já é repleta de originalidade.
O disco ainda apresenta “You Are My Nautilus” e “Ex Sanguine Draculae”, as duas mais longas do tracklist e, cada uma delas, resgatando diversos elementos tanto do início da trajetória, como novamente de “Cruelty And The Beast” (não adianta, este é uma referência eterna!) e obras mais recentes como “Godspeed On The Devil’s Thunder” (2008) e “Hammer Of The Witches” (2015).
Vale destacar a imensa capacidade que Dani Filth tem ao se reinventar utilizando o próprio catálogo, mas nunca deixando de olhar para o horizonte em busca de novas peculiaridades. Um dos pontos fortes do Cradle Of Filth há bastante tempo são as produções impecáveis e em “The Screaming Of The Valkyries” isto é mais uma vez a regra. Todas as climatizações, orquestrações e momentos atmosféricos/soturnos, casam com a aura malévola e blasfema das músicas.
Mais de 30 anos depois o Cradle Of Filth ainda é uma banda incompreendida
A tecladista Zoe Marie Federoff dá um show com seus vocais femininos muito bem encaixados, o baterista Marthus é uma máquina humana de moer e Dani conseguiu finalmente encontrar um meio termo entre a extravagância e o simples/funcional. Em pleno 2025, a audição de um novo álbum do Cradle Of Filth continua sendo uma experiência imersiva que recomendo a todos que apreciam música extrema, mas não se deixam levar por padrões e dogmas pré-estabelecidos. O detalhe é que o grupo britânico fez isso há nada menos que 34 anos e muita gente ainda não se deu conta disso.
Um ponto que vale ser destacado é que se falou muito sobre a colaboração entre o Cradle Of Filth e o astro pop Ed Sheeran. Esta parceria realmente aconteceu, a música foi gravada e está pronta para ser lançada em algum momento no futuro, mas sabiamente Dani não quis colocar a canção no novo álbum. Certamente, iria desvirtuar a análise e um ótimo trabalho poderia ser alvo de polêmicas desnecessárias por conta dela.
Concluindo, “The Screaming Of The Valkyries” é um disco onde os opostos se atraem e dão vazão a uma obra deliciosamente grotesca. É rápido, visceral, agressivo e muito pesado, mas também é bonito, bem executado, orquestrado e melodioso. Dessa forma, precisamos dar os parabéns aos envolvidos, pois conseguiram mais uma vez conceber um trabalho irretocável e acima de críticas enfadonhas sobre “não ser Black Metal o bastante”. Dane-se todas essas bobagens!
Fonte. Mundometalbrcom
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